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quinta-feira, 28 de março de 2019

Pastoreando em meio à depressão


Não me lembro de todos os detalhes da conversa. Minha esposa e eu estávamos sentados juntos. Era o entardecer. Nós tínhamos esse canto em nosso apartamento que chamamos de “o canto”. Era entre a sala de jantar e a cozinha, e tinha espaço suficiente para acomodar duas poltronas, uma mesa entre elas, com uma lâmpada. Passamos muito tempo naquele recanto juntos, com muitas conversas. Este se destaca para mim porque foi a primeira conversa significativa que tivemos sobre minha tristeza.
Minha esposa mencionou perceber alguma desconexão emocional em mim. Eu estava tentando explicar isso de forma divertida, como quando você dorme sobre seu braço e ele adormece. Você se senta e tenta alcançar um copo de água com aquele braço. Você olha para o copo e olha para o braço, mas, por mais que queira alcançar, há uma desconexão com a intenção de alcançar e a capacidade do braço de realmente fazer isso. Foi assim que me senti na minha vida emocional. Eu queria me conectar e emocionalmente estender a mão, mas algo dentro de mim estava adormecido ou desconectado. Algo havia mudado.
Não foi surpresa para minha esposa que eu estivesse triste. Houve circunstâncias desafiadoras na igreja. Houve conflito, confusão e, pela primeira vez em toda a minha vida, eu tinha experimentado ser caluniado e ouvido mentiras sobre mim, onde perdi minha reputação com pessoas de quem gostava. Eu estava exausto. Eu estava regularmente em reuniões até a meia-noite, tentando trabalhar com uma dinâmica relacional realmente difícil. Eu perdi muita confiança em mim mesmo. Eu não sabia qual era o caminho para cima e qual era o caminho para baixo durante grande parte daquela temporada. Durou cerca de 18 meses.
Mas comecei a perceber que não estava apenas triste ou desanimado com as circunstâncias. Algo estava diferente. Houve uma escuridão que se instalou. Minha tristeza e desânimo começaram a envolver-me e a sufocar. Foi difícil não experimentar toda a minha realidade (minha família, trabalho, descanso, orações) através do filtro de tristeza e aflição. “A carne pode suportar apenas um certo número de feridas e não mais”, diz Charles Spurgeon, “mas a alma pode sangrar de dez mil maneiras e morrer repetidamente a cada hora”[i]. Em outras palavras, enquanto a depressão pode ter sido desencadeada por circunstâncias, não foram apenas circunstâncias desencorajadoras que me mantiveram deprimido.
Depressão era algo que eu nunca tinha experimentado. Eu sempre tive a capacidade de enxergar além do horizonte; de falar a verdade em qualquer circunstância e confiar em Deus ou, pecaminosamente, em mim mesmo, para passar por elas. Mas agora era como se eu tivesse vendas emocionais que não me permitiam ver ou sentir muita coisa além da minha tristeza. Minha vida interior parecia rejeitar uma palavra de encorajamento como um corpo que vomita remédio. Eu poderia agarrar a esperança da mesma forma que poderia segurar fumaça com as minhas mãos.
Mas quanto mais eu me abria e falava sobre isso, mais eu ouvia de outros pastores e colegas que eles nunca tinham experimentado depressão até que entrassem no ministério pastoral ou se envolvessem em algum conflito significativo ou desânimo em seu trabalho. Eu não estava sozinho. O que era notável é que, embora as palavras de verdade e encorajamento muitas vezes parecessem tão eficazes quanto um xarope contra a tosse para o câncer de garganta, a presença permanente de um companheiro sofredor era como a mão de Deus sobre minhas feridas. Isso ajudou a ampliar meu escopo da realidade. A depressão era como estar em uma caverna confusa, ofuscantemente escura, mas a presença de alguém que pudesse dar testemunho da minha dor era como uma voz na escuridão, despertando alguma esperança de que pudesse haver alguma direção.
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Eu era pastor e estava deprimido. É claro que a depressão não atinge apenas os pastores e nem todos os pastores experimentam depressão. Mas havia alguns desafios únicos em ser um líder e guia espiritual, ao mesmo tempo em que me sentia enfraquecido pela minha vida emocional, para a qual não tinha muitas categorias. Como eu poderia ajudar os outros se me sentisse desamparado? Como eu poderia pregar o fruto da alegria cristã quando, literalmente, passaram meses desde que eu mesmo a experimentara? Vergonha, culpa e medo eram emoções que pareciam estar se revolvendo em mim.

Não é anormal ser triste

Aqui está a verdade honesta: Bons pastores se colocam no caminho de potenciais críticas e regularmente dentro do domínio e alcance da dor de outras pessoas. Não deveria, então, surpreendê-lo, pastor, que você possa experimentar depressão, mesmo que nunca tenha experimentado isso antes. Carregar o peso emocional consistente das várias dores, medos, críticas, sofrimentos e transições de uma congregação (grande ou pequena) é uma vocação desafiadora. O que ela pode fazer na sua vida interior pode ou irá surpreendê-lo. Mas, embora possa surpreender você, saiba que não é anormal. Além do peso pastoral, a tristeza é uma experiência cristã normal. “O caminho para a tristeza foi bem percorrido, é a trilha normal das ovelhas para o céu, e todo o rebanho de Deus teve que passar por ela”, diz Charles Spurgeon.
Eu sei que em alguns círculos, existem estigmas contra pastores que procuram aconselhamento; mas é uma coisa boa, mesmo em temporadas que não pareçam uma crise. Aconselhar e ter alguém dando alguma direção à sua vida interior é um padrão saudável para os líderes espirituais em todas as estações.
Procure ajuda dentro da igreja local. Nem todo mundo vai ajudar. Nem todo mundo vai entender, mas não tenha medo de falar abertamente sobre isso com seus colegas mais velhos, se você os tiver. A igreja local pode ser (deveria ser) um lugar agradável para as pessoas, até os líderes, desmoronarem. Mas, muitas vezes, as complexidades da depressão podem ser desafiadoras para os líderes leigos. Pode ser sábio procurar aconselhamento profissional.

Encontrando a linguagem

Na minha experiência, encontrar linguagem e categorias para usar a fim de falar sobre minha depressão foi um grande primeiro passo para a cura. Há poder em nomear seu problema. Eu não quero dizer apenas ser capaz de usar a palavra “depressão”. Mas, ainda mais, há algo sobre metáforas usadas por colegas sofredores que pareciam abrir minha compreensão da tempestade dentro de mim. Palavras clínicas podem ajudar na categorização e análise, mas as metáforas pareciam fazer meu coração disparar: “É isso!”
Zack Eswine explica que as metáforas às vezes ajudam a desvendar os mistérios da alma melhor que os termos clínicos, porque eles não explicam muito, mas deixam espaço; elas permitem nuances e diferenciações; elas exigem mais reflexão e exploração[ii]. Encontrar bons livros (A Depressão de Spurgeon, de Zack Eswine ou Lincoln’s Melancholy, de Joshua Wolf Shenk) é uma boa ajuda para acessar um novo vocabulário. Mas aprender a encontrar uma habitação nos Salmos é o melhor remédio.
Comecei a perceber que os Salmos estavam cheios de palavras de crentes desesperados, tristes, desanimados e confusos. Eles tinham palavras para mim que eu não sabia que precisava. O que foi um conforto mais profundo e surpreendente foi que eles foram inspirados por Deus, que sabe o que homens e mulheres precisam dizer quando não sabemos o que dizer. Deus sabe o quanto podemos ficar desesperados e providenciou palavras para nós dizermos nesses tempos. “Aqui”, diz ele, “use essas palavras. Elas vão ajudar”. Sim, o Espírito geme por nós quando ficamos sem palavras como uma folha frágil, mas os Salmos fornecem palavras, linguagem, para quando nossas almas precisam alcançar a expressão. “A minha alma, de tristeza, verte lágrimas”. (Sl 119.28); “Estou cansado de tanto gemer”. (Sl 6.6); “Gasta-se a minha vida na tristeza, e os meus anos, em gemidos; debilita-se a minha força, por causa da minha iniquidade, e os meus ossos se consome”. (Sl 31.10); “Não me arraste a corrente das águas, nem me trague a vorage”. (Sl 69.15); “Pois a minha alma está farta de males, e a minha vida já se abeira da morte”. (Sl 88.3).
Essas palavras podem parecer um guidão emocional enquanto tentamos encontrar sentido e lidar com nossas experiências.

Procure melhores hábitos

Muitos de nós dormem menos horas do que deveríamos e comem mais do que deveríamos. Nós não nos exercitamos e nos sobrecarregamos. Isso não só traz má saúde, mas também leva a insalubridade emocional. Algumas armas básicas contra a depressão é adotar hábitos saudáveis.
Adote um “Sabbath” regular. Lute por um dia de descanso toda semana. Resista a buscar justificativas para “pular” dias de folga. Coma de forma saudável e faça exercícios. Isso tudo trará efeitos surpreendentes em sua vida mental. Ore os Salmos. Crie amizades saudáveis, mesmo que você tenha que sacrificar o conforto por isso. Os pastores conhecem muitas pessoas superficialmente e ninguém profundamente. Desligue o seu telefone da hora do jantar até a hora do café da manhã. Faça pausas regulares nas mídias sociais. Esses ritmos e hábitos não curam sua depressão, mas melhoram seu pensamento e sua vida emocional.
Depois de vários meses de depressão, a nuvem se elevou para mim. Eu experimentei cura. Posso te contar uma coisa maravilhosa? A alegria que sinto agora com amigos, minha esposa, meus filhos, minha igreja é mais profunda. Eu sou um pastor melhor, eu acho. As pessoas aqui e ali que também sofreram depressão ou melancolia expressaram que sentem que sou uma pessoa segura para conversar. Isso é um presente. Você acredita nisso? O Senhor de alguma forma restaurou tudo o que o gafanhoto tinha comido e muito mais. Louvado seja o Senhor! Eu não teria escolhido experimentar a escuridão, mas a escuridão foi transformada em graça e eu não a trocaria por nada.
[i] Spurgeon, “Honey in the Mouth”. MTP, Vol. 37, p. 485.
[ii] Zack Eswine, “A depressão de Spurgeon”: Esperança realista em meio à angústia, Editora Fiel, 2015. 98, 99.

quarta-feira, 20 de março de 2019

4 razões do porque todo pastor precisa de silêncio

Eu passei a maior parte da minha vida adulta odiando o silêncio – mas não sabia disso. Foi um grande ponto cego. Eu desconsiderei meu desejo constante de estar com as pessoas simplesmente sendo extrovertido. Atribuí minha natureza faladora aos meus instintos relacionais intensos. Essas qualidades pareciam ajudar em minhas interações pastorais com as pessoas, então eu não pensava nisso. Não até que comecei minha própria jornada – através de aconselhamento – durante uma crise pessoal onde fui confrontado com essa decepção de longa data.
Meu conselheiro observou um comportamento em minha vida que passou despercebido pela maioria, mas tornou-se um sinal de preocupação para ele. Eu fugia de estar sozinho. Eu ficava desconfortável com o silêncio. Muitas vezes dominava as conversas. Isso expôs minhas terríveis habilidades de ouvir, a qual o conselheiro foi sábio o suficiente para conectar com as questões do silêncio. Ele me pressionou nessa área e foi difícil. Isso levou a uma implosão da minha alma, mas começou um processo desesperadamente necessário de cura.
Através dessa descoberta pessoal, o Senhor me ensinou quatro lições sobre o valor do silêncio.
1. O silêncio expõe a alma
Se as emoções são a porta de entrada para a alma, o silêncio expõe a alma. Eu não estava pronto para enfrentar as coisas feias que haviam sido expostas. Mas Deus, em sua graça, me encontrou de uma maneira poderosa, e minha jornada trouxe paz recém-descoberta à minha alma. Foi através do silêncio em um lugar quieto, meditando sobre a verdade, e em oração pedindo a ajuda de Deus, que eu experimentei este nível mais profundo de sua graça e presença.
Se um pastor quer ter um longo ministério, ele deve aprender a buscar esse tipo de silêncio. Tal silêncio não é alguma forma de meditação secular, mas o silêncio bíblico e a solitude. Don Whitney a considera uma significativa disciplina espiritual da vida cristã. É uma quietude que nos permite crescer mais conscientes da atividade de nossa alma, como o Espírito Santo vive e trabalha em nós. É uma disciplina pela qual nós comungamos com Jesus, nos tornando mais conscientes de sua verdade e presença, e mais receptivos à sua infinita graça. O estudioso puritano e pastor de longa data Joel Beeke articula bem o tipo de meditação que promove essa experiência:
A meditação puritana envolve a mente com a verdade revelada de Deus para inflamar o coração com afeição para com Deus e transformar a vida em obediência. Thomas Hooker definiu assim: “A meditação é uma intenção séria da mente, através da qual chegamos a procurar a verdade e estabelecê-la efetivamente no coração.” A direção de nossas mentes revela o verdadeiro amor de nossos corações e, assim, Hooker disse que aquele que ama a Palavra de Deus medita sobre ela regularmente (Sl 119. 97). Portanto, a meditação Puritana não está repetindo um som, esvaziando a mente, ou imaginando visões físicas e sensações, mas um exercício concentrado de pensamento e fé sobre a Palavra de Deus.
2. Silêncio confronta as vozes
Essas vozes são as mensagens que ouvimos sobre nós mesmos. Elas são vozes daqueles que atravessam o espaço da nossa vida e falam mensagens que o inimigo ama sussurrar de novo e de novo em nossos ouvidos. São as mensagens interpretativas daqueles atualmente em nossa vida. Quando essas vozes são duras, abusivas e mentem sobre nosso valor e identidade em Cristo, elas são desagradáveis e corremos delas.
Essas vozes me atormentavam. Vozes abusivas do meu passado, mentiras do inimigo, e palavras dolorosas de crítica criaram essas mensagens de fracasso e autoaversão. Elas eram especialmente altas quando eu estava sozinho. Então, para escapar das vozes, fugia do silêncio. Mas eu precisava de silêncio para confrontar essas vozes, para contrapor as mentiras nas quais eu acreditava há muito tempo com a verdade do evangelho. Martyn Lloyd-Jones abordou de forma notável essas vozes no contexto da depressão:
O problema principal em toda essa questão da depressão espiritual é, em certo sentido, que permitimos que o nosso eu nos fale ao invés de conversar com o nosso eu. Estou apenas tentando ser deliberadamente paradoxal? Longe disso. Essa é a essência da sabedoria nesse assunto. Você já percebeu que a maior parte de sua infelicidade na vida se deve ao fato de estar ouvindo a si mesmo em vez de falar consigo mesmo?
O silêncio nos permite confrontar a realidade de que, quando ouvimos a nós mesmos, em vez de falarmos para nós mesmos, ouvimos com frequência palavras duras que esmagam nossa alma.
3. O silêncio nos ensina a ouvir
Fiquei profundamente perturbado ao descobrir que tinha sido pastor por tanto tempo e ainda assim permanecia um ouvinte ruim. Claro, eu escutava, mas era principalmente para preparar uma resposta. Eu precisava aprender a ouvir sem precisar responder – apenas para ouvir e ter empatia.
Ao abraçar o silêncio, percebi que estava aprendendo a ouvir. Eu ouvi sons ao meu redor que eu nunca havia notado antes. Eu me senti mais receptivo à Palavra de Deus. É incrível o que acontece quando você não está preocupado em tentar descobrir o que dizer ou fazer logo em seguida.
4. O silêncio testa nossa necessidade de ruído
Eu não tinha ideia de que “precisava” de barulho sempre que minha alma era atormentada em silêncio. O silêncio expõe a alma e testa o quanto dependemos do ruído para bloquear nossa dor. Esta é uma das muitas razões pelas quais todos nós precisamos de períodos de tempo longe do nosso telefone, e-mail, mídia social e todos os dispositivos eletrônicos que criam a fonte constante de ruído.
Os pastores não precisam fazer muito esforço para encontrar barulho e distração, mas o silêncio é outro assunto. Nós devemos lutar por isso. O silêncio nos desafia a enfrentar nossa dor e permitir que o evangelho penetre profundamente em nossas almas, onde encontramos a cura.
Abrace o silêncio
Enquanto estava em um retiro de silêncio, encontrei essas palavras (abrace o silêncio) em uma sala dedicada ao silêncio e à solitude:
A regra do silêncio foi considerada importante aqui, como um meio de garantir que não se desperdice essa preciosidade, mas exigindo um tempo de refrigério através da desaceleração e poucas conversas. As comunidades que respeitam o crescimento humano provavelmente precisam prever explicitamente a solitude, caso contrário, uma fonte potencial de enriquecimento é perdida.
Eu odiava o silêncio, mas aos poucos percebi que precisava fazer “provisão explícita para a solitude” em prol da minha alma.
Jesus nos libertou do poder do pecado, da vergonha e da morte e nos resgatou da ira de Deus que merecemos. É tudo pela graça. Nossa identidade está agora em Cristo e somos eternamente filhos adotados de Deus. Temos o Espírito Santo habitando em cada um de nós pela fé, tornando-nos mais parecidos com Jesus todos os dias. E, no entanto, muitos cristãos não conseguem sentir profundamente o poder da graça de Deus no evangelho.
Isso inclui pastores e foi assim comigo na maior parte do meu ministério.
O silêncio é uma ferramenta maravilhosa e um presente de Deus para trazer essa consciência. Abrace o silêncio como aquele bálsamo calmo e curador para a sua alma barulhenta e inquieta.


domingo, 10 de março de 2019

Permita-se errar!






...e nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplácito de sua vontade, para louvor e glória da sua graça, pela qual nos fez agradáveis a si no Amado. Efésios 1.5-6

Gosto de falar sobre esse tema, pois por muito tempo fui um algoz de mim mesmo. Lembro de um artigo de revista que mostrou a vida do famoso cantor João Gilberto. Ele é conhecido pelo seu ouvido “absoluto” em matéria de música, mas extremamente exigente consigo mesmo. Muitos dos seus discos não são relançados porque ele acha defeito em todas as fases da produção. Nunca está bom. Um médico amigo seu, afirmou “minha impressão é que ele sofre da ‘síndrome do escrivão’, uma cobrança e perfeccionismo tão grandes que, quando vai tocar, sente até dor nas articulações”.

OS SINTOMAS

O perfeccionismo afeta muita gente e é a causa da infelicidade que atormenta suas vítimas. Não somos capazes de ser perfeitos. Talvez excelentes no que fazemos, mas longe da perfeição que os outros ou nós mesmos consideramos ideal. O perfeccionismo é a constante sensação de que nunca se consegue atingir o padrão desejado, nunca ser satisfeito naquilo que se propõe a fazer e que afeta tudo ao nosso redor, pois nada fica bom.

Como a pessoa jamais consegue atingir o que considera perfeito, experimenta-se uma sensação de auto depreciação e autodesprezo. Quando pegos em uma situação de surpresa, o sentimento de não ter desempenhado o papel ideal vem como um carcereiro. Afinal, “por que não fiz diferente? Por quê não falei a coisa certa para o meu chefe? Por quê não estudei direito? Por que não preguei aquele sermão como deveria?”. E aquela punição auto imposta se arrasta por dias a fio.

Alguns sinais podem mostrar se estamos reféns de sentimentos paralisantes que não nos deixa prosperar na área dos relacionamentos e da saúde mental. Um deles é a tirania dos deveres. A pessoa perfeccionista sempre achará que deveria ter feito melhor, que tem que melhorar ou que não foi muito bem. Além disso, se cobra constantemente por que seu empreendimento, sua igreja ou organização não está conforme sua expectativa, e a causa é sempre resulta em autocondenação. Girar a roda da vida constantemente é o seu trabalho e não se dá descanso por isto.

Outro sintoma do mal da exigente pessoa é a auto depreciação. Ela sempre achará não ser adequada para a tarefa que desempenha. Muitos outros com bem menos capacidade se consideram bem-sucedidos e vivem tranquilos com suas limitações, mas não o perfeccionista que é excelente em tudo, mas não se dá conta disso. Às vezes vamos um velório e ficamos admirados do tanto de gente que vão homenagear a bem-aventurada pessoa. Talvez se o perfeccionista pudesse ver o próprio velório ficaria surpreso por saber o quanto era admirado. Mas não precisa chegar a esse ponto, não é?

A ansiedade também assola a pessoa perfeccionista. Por esperar demais a aprovação dos outros, não consegue dar tempo ao tempo para que seu trabalho seja reconhecido pelos resultados. O perfeccionista é muito suscetível ao que as pessoas vão pensar dele e procura desesperadamente a aprovação alheia, o qual nunca vem de modo suficiente. Como não consegue aceitar a si mesmo e não tem convicção da aprovação do Pai celestial, se torna presa fácil das estimativas e opiniões acerca de si. É escravo dos cenhos franzidos do patrão, da esposa, do marido e dos amigos(as). Tenho um amigo que é tão certinho que nem consegue desligar o aplicativo de GPS sem pedir desculpas!

Além do mais, o perfeccionista é de difícil trato, pois só consegue observar nos outros o que fazem de errado, querendo corrigi-los o tempo todo. Ele não entende que ninguém muda ninguém, pois a pior forma de piorar alguém é tentar mudá-lo. Isso é trabalho do Espirito Santo. Se você quiser piorar alguém tímido, inseguro ou radical, tente muda-lo. Mas o perfeitão tenta!

A CURA

Os perfeccionistas foram programados de uma forma que se encheram de realidades imaginárias, ideias geniais, mas de realizações impossíveis, e de cobranças feitas a eles pelos seus antepassados. A cura começa a se instalar com a reprogramação da mente e de uma vida espiritual autêntica, baseada na aceitação incondicional por Deus através de Cristo. É encontrar a graça de Deus. Alguém disse que graça e o rosto que Deus tem quando olha para nossa imperfeição, nosso pecado, fraqueza e fracasso e nos chama para o Seu reino. Gosto de um autor que afirma Deus nos ama como somos e não como deveríamos ser.

Quando conhecemos o evangelho, aprendemos que toda a nossa aprovação deverá vir daquele a quem nos recebeu por sua inteira graça. A Bíblia diz que Deus nos aceita pela perfeição do Amado de Deus, Jesus. Ele cumpriu toda a justiça durante seus mais de trinta anos de perfeita obediência a tudo que o Pai ordenara. Ele fez isto por nós. Tendo realizado a obra que jamais poderíamos fazer, ele carregou a sentença da justiça divina e pagou nossa dívida acumulada. Agora ele está ressurreto, sentado à destra do Pai, intercedendo por nós.

Somente ao descansar em Cristo é que somos aptos para permanecer em pé com todos os nossos defeitos e imperfeições diante de um Deus tão perfeito. Jesus é a suficiência de Deus para a nossa deficiência. Tudo o que ele exigiu de nós Ele encontrou perfeição no Filho. Escondidos em Cristo, encontramos descanso para a nossa doença de querer ser perfeitos, podendo experimentar a liberdade de errar e não cair prostrados.

Errar e aceitar as próprias limitações é libertador. “Não sei mesmo”. “Não consigo mesmo”. “Sim, realmente ele/ela é melhor do que eu nessa área”. Desabafar como o Apóstolo Paulo: “miserável homem que sou...” (Romanos 7.24) mas descansar na fé curadora de que um dia realmente seremos perfeitos: Porque é necessário que este corpo corruptível se revista da incorruptibilidade, e que o corpo mortal se revista da imortalidade (1 Coríntios 15.53) Dê-se ao direito de falhar e saiba que disso faz parte o ser humano. Começar com essa consciência já é o primeiro passo em direção à cura.



Pr. Fábio Alcântara