Cura-me, SENHOR, e serei curado; salva-me, e serei salvo,
porque tu és o meu louvor. Jeremias 17.14
“Não, não
está bem”. Mais do que resposta, isto se tornou apenas uma forma de tratamento.
Seria um grande alivio poder responder sinceramente quando estamos vivendo
momentos vulneráveis. Mas não é bem assim nos círculos onde vivemos. Ali só há
espaço para a produtividade, para os portadores do troféu “saradão-saradona”. Mas
muitas vezes não estamos bem, e é assim mesmo.
Caminhando
para a segunda fase da vida, me lembro de quando era pós adolescente
(adolescente nem se fala não é mesmo? Quem já não foi o Batman ou a Mulher
Maravilha, e achava que ficaria assim pra sempre?) Jamais tive nem dor de cabeça,
nem retirei uma unha. Mas de repente, como uma chuva que a gente pega no meio
do caminho, a doença e as limitações se instalam, sem pedir licença.
Simplesmente chegam. Daí minhas caras leitoras e leitores, se virem!
A fé enferma
Em muitas
igrejas existe uma cobrança exagerada, para que seus membros sejam perfeitos,
com uma boa saúde, família ajustada, finanças bem aplicadas, que
estariam diretamente atreladas a uma adequada vida espiritual.
Essa cultura está há muito ligada na nossa
tradição, afinal a igreja se torna um lugar de fé, de triunfo, sem espaço para
o sofrimento, pois se algo acontece ao crente, é porque falta oração e
dedicação, pois obrigatoriamente a devoção vem acompanhada de recompensa. Na
cultura do pódio não existe lugar para os fracos. Mas ter uma adequada vida
espiritual necessariamente não significa ausência de doenças, conflitos ou
problemas relacionais.
Os cristãos não tinham essa mente triunfalista, mas
viviam com o pé no chão:
Filipenses 4
10 Fiquei muito alegre no Senhor porque, agora, uma
vez mais, renasceu o cuidado que vocês têm por mim. Na verdade, vocês já tinham
esse cuidado antes, só que lhes faltava oportunidade. 11 Digo isto, não porque esteja necessitado, porque
aprendi a viver contente em toda e qualquer situação. 12 Sei o que é passar necessidade e sei também o que
é ter em abundância; aprendi o segredo de toda e qualquer circunstância, tanto
de estar alimentado como de ter fome, tanto de ter em abundância como de passar
necessidade. 13 Tudo posso naquele que me fortalece.
Problemas não significam que algo está errado com
sua fé. A Bíblia é pontuada de oásis no deserto, pontualidade de vitória em
meio às lutas, promessa de vencer o último inimigo, a morte e a promessa dos
novos céus e a nova terra, enquanto esta cambaleia. Quando lemos o sermão que
Jesus pregou no monte, percebemos os pobres de espírito, os que tem sede e fome
de justiça, os que sofrem perseguições, os que choram e os que pacificam,
porque estão no meio da guerra (Mateus 5). Turma atribulada essa, não é?
Sheila Walsh, pastora e cantora mundialmente
conhecida por suas mensagens motivacionais, chegou num tempo em que precisou
deixar a vitrine para tratar da sua alma. Demorou aceitar que não estava bem:
em seu desabafo, afirmou: “acredito que todos os mecanismos que temos para
tratar transtornos mentais são bênçãos de Deus. Agradeço a Deus, todos os dias,
por meus antidepressivos. Não espero ser curada, pois entendo a depressão como
uma doença de tratamento contínuo. Já tive vergonha disso, mas não tenho mais”.
A fé tem que ser vivida na verdade, assim como Cristo procurava extrair dos
doentes de alma que O procurava.
A Bênção de Não Fingir
Muitas pregações são opressoras ao
invés de serem libertadoras. Não tem espaço para a dor, para o fracasso, para
as frustrações de não ser quem é, de ter o peso desejado, de não ter a família
perfeita sem ter que passar pelo tribunal, de estar quebrado financeiramente.
Mas isso muitas vezes são a regra e não exceções. Um pouquinho de fracasso
coletivo serve de terapia, afinal tem gente como a gente!
Cristo é o oposto da terapia do
sucesso pregada. Mas seu fracasso aparente não significou uma vida derrotada. A
cruz de cristo significou vitória, enquanto aqui neste mundo o trono significa
fracasso dos esquemas humanos. Só a vida de
cruz pode fazer prosperar a obra de Deus. A coroa do sucesso é posta na
cabeça de quem se rende à Sua vontade, não de quem insiste em seus planos.
Salmo 64
3 Eles afiam a língua como espada e apontam, quais flechas, palavras amargas, 4 para, às escondidas, atingirem o íntegro; contra ele disparam repentinamente e não temem.
5 Teimam no mau propósito; falam em secretamente armar
ciladas, e dizem: “Quem nos verá?”
6 Planejam iniquidades e dizem: “O plano que fizemos é perfeito!” Os pensamentos e o coração de cada um deles são
um abismo.
Isaías 53
10 Todavia, ao SENHOR agradou esmagá-lo, fazendo-o sofrer. Quando ele der a sua alma como oferta pelo pecado, verá a sua posteridade e prolongará os seus dias; e a vontade do SENHOR prosperará nas suas mãos.
Muitos cristãos levam anos escondendo as dores
cruéis de seus estigmas. Mas a pessoa que interiorizar os sentimentos e finge ao
máximo para mostrar que tudo está bem, culmina em depressão e acaba abandonando
a igreja, ficando desapontada por aquilo que Deus nunca prometeu.
Ambiente sadio é o ambiente onde a verdade pode ser
expressa. Quando um (uma) cristão não tem liberdade de expressar seus
sentimentos, a ferida que não fecha o faz desconfiar da salvação que há em
Cristo Jesus. A alma ferida desconfia da vida abundante que Deus promete em sua
Palavra.
Ninguém
consegue fingir por muito tempo. Gosto da frase de um pastor amigo que afirma:
“faz parte do impostor, o falso eu, viver nos bastidores com medo de dizer quem
é e ser rejeitado, mas o Cristo do Calvário já realizou uma obra de aceitação
tão perfeita, que precisamos torná-la clara, para que desapareça esse impostor
enganoso e cruel”. Não precisar fingir é uma benção.
A Verdade Que Cura
Não há nada que possa se
comparar à excepcional caraterística do Evangelho do que a possibilidade da
aproximação ao nosso Deus.
A Bíblia afirma:
“aproximemo-nos
com um coração sincero, em plena certeza de fé, tendo o coração purificado de
má consciência e o corpo lavado com água pura”. (Hebreus 10.22).
Coração sincero e
purificado pela obra de Cristo, e o corpo lavado pelo batismo como testemunho
de rendição são os requisitos. Enquanto na maioria dos sistemas religiosos
temos que nos aproximar perfeitos e com bom acabamento para sermos aceitos diante
da divindade, Jesus convida os doentes e falidos para se apresentar diante dele
na verdade sincera de um coração quebrado para receber seus benefícios. E todos
(as) que assim se apresentaram foram recompensados.
Viver
a verdade, sem medo foi o que Jesus instigou naqueles que desejavam libertação
da ditatura das aparências.
A
mulher samaritana confessou sua carência e instabilidade matrimonial e foi
elogiada por ter falado a verdade de estar no seu sexto marido (João 4.18);
Zaqueu
foi instigado a confessar, mesmo com um falso “se”, a restituir os que passara
para trás (Lucas 19.8); o pretenso cego deveria dizer com humildade o que
aquele homem desprezado de Nazaré podia fazer por ele sem ter vergonha ao pedir
cura. A coragem de dizer a verdade curou a todos.
Não
precisamos ser muito duros com a gente mesmo. Enquanto acharmos que temos de
parecer perfeitos, perderemos a grande oportunidade de apontar Cristo, que é
perfeito, para as pessoas. A boa notícia é que Jesus é perfeito. A mesma Sheila
aconselha a sermos “brutalmente honestos(as) sobre as áreas da vida que são uma
decepção para nós.
Sempre digo aos perfeccionistas ansiosos que vai
dar tudo errado antes de dar certo. Aguenta firme! Enquanto isso, bora viver
com fé e liberdade de poder reclamar de vez em quando, pois até isso a religião
sem coração tirou de nós. Você é normal.
Pr. Fábio Alcântara
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